O relato de histórias de golpes de pessoas buscando enganar outras para obter vantagem, normalmente em dinheiro, tem sido uma constante. Tanto assim que esse tema, objeto do presente artigo, também foi tratado nas nossas dicas de filmes no canal do Youtube – Andrea Teichmann Vizzotto Advocacia. Nesse canal, quinzenalmente são indicados filmes com algum teor jurídico ou que levem a questionamentos sobre Direito e Justiça. Assim como na realidade, são muitos os filmes que tratam desse tipo de astúcia. E por isso, ao invés da indicação de um filme, foram indicados cinco. São estórias que tratam de golpes na vida pessoal, amorosa, profissional, com mulheres e homens e com idosos. Cada caso mais chocante que o outro e que impressionam ao se pensar que qualquer um de nós poderia ser a vítima.
Tão conhecido o tipo penal do estelionato, previsto no artigo 171, caput, do Código Penal, que na linguagem informal a expressão “171” é sinônimo de armadilha, embuste, embromação ou burla, por exemplo.
O estelionato é definido pelo referido artigo do Código Penal, como a conduta de obter vantagem ilícita, para si ou terceiro, em prejuízo de alguém, ao manter ou induzir essa pessoa em erro, mediante artifício ardil, ou qualquer outro meio fraudulento. Assim, é necessária a presença desses quatro elementos do caput para caracterizar o crime de estelionato. A pena prevista para tal delito é reclusão, de um a cinco anos, e multa, na sua forma simples.
A última expressão “ou qualquer outro meio fraudulento”, faz com que o artigo 171, caput, se configure um tipo penal aberto, ou seja, necessita de complementação interpretativa do sujeito que interpreta a norma, a fim de verificar se a conduta se enquadra no tipo penal.
Além disso, apenas admite-se o estelionato na forma dolosa, já que, pelo Princípio da Excepcionalidade dos Crimes Culposos, a culpa necessita de previsão expressa em lei, o que não ocorre no referido crime. Porém, o delito admite tentativa, uma vez que se trata de crime plurissubsistente – aquele no qual a conduta do agente pode ser fracionada, já que o estelionato só se consuma com o recebimento da vantagem ilícita.
No parágrafo 1º, do artigo 171, há a figura chamada de estelionato privilegiado. Nesse caso, sendo o agente primário e o prejuízo da vítima de pequeno valor, o Juiz poderá diminuir a pena de 1/3 a 2/3, substituir a pena de reclusão por detenção, ou aplicar a apenas multa. Já, no artigo 171, parágrafo 2º, são previstas as mesmas penas do caput para quem praticar as condutas ali dispostas.
Recentemente, a Lei Federal 14.155/2021 incluiu os parágrafos 2º-A e 2º-B, ao artigo 171, que preveem a fraude eletrônica, forma qualificada do estelionato. Nesses casos, conforme o parágrafo 2º-A, quando há fraude cometida com a utilização de informações fornecidas pela vítima ou por terceiro induzido a erro por meio de redes sociais, contatos telefônicos ou envio de correio eletrônico fraudulento, ou por qualquer outro meio fraudulento análogo (tipo penal aberto – necessita de complementação interpretativa), a pena será de reclusão, de quatro a oito anos, e multa. O parágrafo 2º-B, prevê aumento de pena (de um terço a dois terços) para o estelionato qualificado, caso a conduta seja praticada mediante a utilização de servidor mantido fora do País.
Ainda sobre aumento de pena, o parágrafo 3º, do artigo 171, prevê aumento de um terço, caso o crime seja cometido em detrimento de entidade de direito público ou de instituto de economia popular, assistência social ou beneficência, e, nos termos da Súmula 24 do STJ, contra entidade autárquica da previdência social; o §4º, do referido artigo, prevê aumento de um terço ao dobro, nos casos do crime ser cometido em desfavor de idoso ou vulnerável.
Via de regra, o estelionato é um crime de ação penal pública condicionada à representação, ou seja, a denúncia somente pode ser oferecida pelo titular da ação penal nos casos em que há representação da vítima. Todavia, nas hipóteses previstas no rol do parágrafo 5º, do artigo 171, torna-se crime de ação penal pública incondicionada, quando é dispensada a representação da vítima.
Como se verifica, a legislação é bastante específica e detalhada para dar conta das inúmeras situações que envolvem golpes.
Pessoas são enganadas por parceiros apaixonados não antes de envolvê-las emocionalmente. Esses casos viraram clichê. O filme “O golpista do Tinder” relata situação verídica acontecida. E, para
não dar spoiler, recomenda-se todo o cuidado nas relações seja qual foi o meio de encontro dos parceiros.
Situação muito comum também é relatada por idosos. Qualquer um de nós conhece, ou ouviu falar, de caso envolvendo algum idoso que foi enganado por terceiro empregado, cuidador, curador ou acompanhante, por exemplo. Valendo-se da condição de fragilidade dos mais velhos, pode ocorrer situações bastante desagradáveis dentro do próprio lar dessas pessoas. O filme “Eu me importo” é primoroso na demonstração desse tipo de situação
Sócios, empregados, empregadores, prestadores de serviços e consumidores se somam àqueles que enganaram ou foram enganados, aumentando a lista das denúncias de golpes que chegam à polícia todos os dias. Os filmes “A Casa”, ” Causalidade” e no “Limite da traição” são inusitados no que demonstram, mas simples na forma de demonstrar a forma de enganação.
O presente artigo tem por objetivo, não assustar, mas alertar as pessoas para as situações do cotidiano. Buscando referências, informações e a estabilidade da relação desenvolvida até que se possa estar racionalmente seguro. Os filmes indicados, algumas obras de ficção, ajudam a ilustrar a razão do alerta.
Cautela e racionalidade para se viver sem sobressaltos.
Andrea Teichmann Vizzotto
João Pedro Vizzotto Cirne LIma